O momento está a chegar!

Trail de Abrantes 100 - 50kms

Tempo: 03:57:58
Distância: 50.42kms
Classificação Geral: 2º Classificado
Classificação Escalão: 2º SenM

O relógio anda cada vez mais rápido... Já há alguns dias que ando a fazer a contagem decrescente para o grande objetivo do ano, que vou pensando na quantidade de treinos específicos que faltam, que vou tentando abstrair-me de tudo o que me rodeia para tentar focar completamente no Ultra Trail do Zêzere.

Algures no caminho da preparação, acabou por surgir o Trail de Abrantes 100 - 50kms, um trail que já sabia ser rolante, onde poderia testar as boas sensações que andava a sentir e onde fecharia o ciclo de treinos "grandes" antes de 10 de Novembro. Fiz a preparação para a prova com a última vitória na cabeça, a motivação estava em alta e praticamente não falhei no plano de treinos que estava traçado... Quando cheguei à véspera da prova, sentia-me com força e cheio de vontade de partir!

Assim que acordei no sábado, cumpri todos os rituais em casa e assim que me juntei ao resto dos caracóis era altura de verificar o estado dos heróis dos 100kms... O Pedro Ricardo e o Gil seguiam bem, com boas sensações e o Gaio um pouco mais atrás! Seguimos em direção a Abrantes para levantar os dorsais, o secretariado funcionou muito bem, demorámos nem 5' a levantar dorsais e seguimos para o Pego, local de partida para a prova dos 50kms e ponto de passagem dos 100kms. Quando lá chegámos o Pedro e o Gil já tinham passado, mais uma vez seguiam bem e o Gaio estava mesmo a passar... Eu estava a equipar, não consegui dar apoio mas o meu pai trazia as boas notícias de o Gaio estar a recuperar as boas sensações e ia agora iniciar a recuperação tal como ele está habituado! O local da partida tinha uma ótima organização, tudo disponível para os atletas que iriam partir e para os que estavam no abastecimento e seguiriam viagem! Na partida estava o enorme Hugo Água... Qualquer partida com este homem ganha todo um novo significado: um conhecimento de todos os atletas, um estudo dos últimos resultados de cada um e uma interação enorme com todos os intervenientes faz com que o tempo até à partida passe muito, muito rápido! Antes de entrar para o controlo 0, uma rápida conversa com o Bruno Ferreira e seguimos para a linha de partida.

A contagem decrescente foi feita de 10 a 0 e cumpriu-se o objetivo de ser dada exatamente 7h após a partida dos 100kms. Assim que saímos o ritmo foi muito controlado, eu seguia na frente mas a 4'30''/km, não havia ninguém a assumir a prova até que, 500mts após a partida, o Bruno Ferreira se junta a mim e o ritmo acaba por subir automaticamente! Ainda o primeiro quilómetro não estava percorrido e começamos a passar pessoal da prova dos 100kms... Como os atletas estavam muito espalhados e os trilhos/estradões eram por norma largos, era uma ótima sensação ter sempre alguém a fazer-nos companhia ao longo do percurso! O primeiro atleta que passei foi o Marçal, sempre com uma palavra amiga a desejar força para a prova mesmo estando ele a meio de uma prova muito mais difícil... É este o verdadeiro espírito do trail! Lá lhe desejei boa sorte para o resto do percurso e seguimos caminho. Assim que o ritmo subiu fui acompanhando o Bruno, trocámos algumas palavras mas as sensações não estavam a ser as melhores, parecia que estava cansado! Quando olhei para o relógio percebi imediatamente o motivo, seguíamos a ritmos abaixo de 4'/km a subir e quando olho para trás já estamos sozinhos, vindo dois atletas a cerca de 50mts de distância para nós. Fui acompanhando o Bruno mas a partir dos 3kms, já com a distância para os atletas que vinham atrás mais acentuada, decidi meter o meu ritmo e deixar o Bruno sozinho na liderança. Os trilhos seguiam maioritariamente largos, apenas algumas zonas de ligação muito curtas em que não havia trilho mas os ritmos seguiam muito altos! Quando chegamos à Central Termoelétrica do Pego, vejo o meu pai ao longe... O primeiro abastecimento estava alcançado ainda não tínhamos 25' de prova. O tempo estava perfeito, pouco calor, o sol ainda estava fraco e a vontade de beber água também ainda não tinha aparecido. Acabei por nem sequer parar no abastecimento, disse ao meu pai que estava bem e segui para tentar alcançar o Bruno, que ainda estava em linha de vista. Foi neste abastecimento que voltei a ser "acarinhado" por um atleta... Não imaginam como sabe bem ouvir palavras de apoio, ouvir elogios e ainda ouvir falar do blogue. Segui a um ritmo muito forte! Logo a seguir ao abastecimento tínhamos uma descida até uma linha de água e uma subida, não demasiado grande mas o suficiente para deixar de ver o Bruno. Logo a seguir tínhamos uma zona plana por onde íamos passando por vários atletas dos 100kms. Várias foram as vezes em que ia olhando para trás mas o avanço parecia estar "seguro"... Mantive o ritmo o mais forte que me parecia possível para quem ia fazer uma prova de 50kms e esperei que no fim não quebrasse.

A chegada ao segundo abastecimento era feita em nova subida que terminava já dentro da povoação da Concavada... Embora não fosse muito inclinada obrigou a diminuir o ritmo alto com que seguia e quando voltei a ver a caracolada toda no abastecimento (estavam a apoiar o pessoal dos 100kms que já tinham passado e ficaram para me apoiar, obrigado a todos), aproveitei para recuperar o fôlego para passar no abastecimento o mais rápido possível. Ainda só tinha bebido um dos flasks, cheguei, troquei algumas palavras com o meu pai, troquei o flask, comi duas batatas fritas e tinha que arrancar! Tinha voltado a ver o Bruno... Quando eu estava na reta antes do abastecimento, ele estava mesmo a sair o que só podia significar que estava a fazer uma boa prova... Queria sair o mais rápido possível para me manter  próximo do Bruno e afastado da terceira posição.

A partir daqui o tipo de percurso seria diferente... Segundo o brifingue inicial da prova teríamos uma primeira parte muito rolante até aos 15kms, uma zona técnica até aos 25kms e uma segunda zona técnica até aos 35kms. A primeira parte estava mais que confirmada, os primeiros quinze quilómetros tinham sido feitos em 1h13' com cerca de 500mts de D+ e agora era altura de confirmar a segunda parte. Assim que saíamos do segundo absatecimento iniciávamos uma longa descida, pouco técnica e que permitia impor ritmos altos até chegarmos à ponte sobre o rio. Foi durante esta fase que passei inicialmente o Gaio da minha equipa, o André Monteiro (um velho amigo) e o Filipe Torres (uma das minhas inspirações para iniciar e continuar com o blogue)... Com todos eles troquei algumas palavras e que bem que souberam! Quando estamos naquelas alturas de intensidade elevada, ver uma cara conhecida a dar-nos força é um estímulo enorme para continuarmos focados! Obrigado aos 3 e a todos os que foram dando força. Voltando à prova, no final da ponte virávamos à direita para o primeiro trilho técnico da prova! Um trilho onde ultrapassávamos uma zona de levada, com algum sobe e desce por escarpas para fugir às zonas com água mais abundante... 

Uma das zonas de Levada da prova

A partir daqui a prova entrava numa toada de subida (embora não fosse constante)! As sensações estavam perto de perfeitas, sentia-me com capacidade para andar forte ao longo de mais alguns quilómetros e praticamente não dei pela subida passar. Quando já estava próximo do abastecimento dos 25kms, sensivelmente a meio da prova, passo pelo Pedro Ricardo e pelo Gil... Pergunto-lhes se estão bem, eles dão mais algumas palavras de apoio e sigo logo caminho até ao abastecimento! Algumas centenas de metros antes de lá chegar, apanho a malta que iria partir dez minutos depois da minha passagem para a prova dos 25kms e acabo por seguir atrás deles, pelo caminho que não o da prova! Felizmente que estava lá muita gente que percebeu o meu erro e nem 50mts fiz fora do caminho... Voltei imediatamente para o estradão correto e chego finalmente ao abastecimento onde tinha novamente a equipa de apoio do Caracol. Ainda digo algumas palavras ao pessoal mas como sempre a minha atenção está praticamente centrada no meu pai... Trocamos mais algumas palavras, ele diz-me como está a classificação, troco os dois flasks pela primeira vez (o calor estava a começar a apertar), como dois bocados de melancia e sigo! Sabia que o Bruno me estava a ganhar avanço aos poucos e sabia que tinha alguma margem para trás mas queria aproveitar as boas sensações que ia tendo e saí do abastecimento para a segunda metade da prova.

Assim que saímos do abastecimento continuamos a subida que nos vinha a acompanhar desde os 20kms mas rapidamente o cenário se inverteu... Desde os 27 até aos 29kms o percurso era maioritariamente a descer, em trilho fácil o que me permitiu voltar a andar bem! Por volta dos 29kms veio a confirmar-se a terceira "profecia" do organizador da prova: uma segunda zona técnica, esta mais rochosa onde tínhamos que andar a saltar de pedra em pedra, ao lado da margem do rio, passando depois por uma zona de levada onde tínhamos que nos ir baixando para evitar bater contra as pedras salientes. Passados cerca de 500mts estávamos de volta aos trilhos mais fáceis... Estas duas zonas ligeiramente mais técnicas e curtas vieram acrescentar alguma beleza aos trilhos, não exigindo um grau técnico muito elevado, permitindo assim aos atletas não diminuírem muito o ritmo, desfrutando de tudo o que a zona tem para nos dar, os parabéns à organização! 


O saltar de pedras na segunda zona técnica

Dos 30kms até aos 41kms temos a zona mais crítica da prova... Crítica principalmente por ser a zona com mais desnível! O sobe e desce era constante, por duas vezes tive que meter a passo em subidas mais inclinadas e as pernas começavam a pesar (os 30kms em 2h13' contribuíram para isto de sobremaneira)... Apesar de tudo isto, íamos passando por alguns dos trilhos do Corvus Trail de Maio, o que acabou por ser bom para mim porque já sabia o que esperar em cada um dos locais (uma das vantagens de ter boa memória fotográfica). Se as pernas estavam a começar a ficar pesadas aos 30kms, aos 41kms já estavam mesmo pesadas! 

Abastecimento intermédio entre os 25kms e os 42kms

Ainda assim, faltava apenas uma subida mais dura logo após o abastecimento e os principais desníveis estavam ultrapassados, faltando apenas o acesso à cidade de Abrantes. Disse ao meu pai no último abastecimento (41kms) que estava a começar a acusar o cansaço, ele disse-me que tinha perdido ligeiramente avanço para trás e começo a fazer contas (o meu método de entretenimento ao longo das provas grandes)... Percebo que para perder o avanço que tinha construído tinha que andar lento em comparação com o que vinha a fazer até ali e que lá atrás tinham que andar forte mas mesmo assim, não queria facilitar numa prova que me estava a correr tão bem! Passo à distância da Maratona ao longo da última subida pronunciada e registo o tempo para consultar em casa se tinha novo Record Pessoal e tinha mesmo: A partir de 20 de Outubro de 2018 passei a ter um registo de 3h17' à Maratona, numa altura em que tínhamos ligeiramente mais do que os 1000mts de D+. Terminada a subida, era altura de voltar aos ritmos fortes, sentia que apesar de ter as pernas pesadas, ainda havia um resto de forças para estes 6kms finais... Começei a fazer contas e pela quebra que vinha a ter, as sub 4h seriam muito difíceis de alcançar mas queria tentar obter esse registo. 

Tento forçar o andamento e finalmente chego ao parque de Abrantes, um local que sabia ser muito perto do local da chegada... Saio do jardim e localizo-me imediatamente dentro da cidade de Abrantes, sei onde estou e embora não saiba com precisão a distância que ainda me faltava até ao estádio, sabia que estava muito próximo. Faço a ciclovia ao lado do Regimento de Apoio Militar de Emergência e chego à primeira rotunda de Abrantes... Estava mesmo próximo mas ainda não ouvia o Hugo! Seguimos por uma estrada para uma zona de vivendas, paralela à zona desportiva da cidade e viramos para a esquerda, numa descida pronunciada e aí sim, começo finalmente a ouvir o Hugo! Estava muito próximo mesmo, uma das melhores provas do ano estava a chegar ao fim e já me faltava menos de um quilómetro... Faço a descida forte e apanho a subida final para a zona do estádio. Embora tenha feito grande parte da subida a andar, a vontade de voltar a correr era grande e assim que aligeirou, voltei a correr e aproximei-me da entrada do estádio, admito que com alguma emoção por ter a noção que finalmente estava a correr a um nível onde me sinto muito bem e para o qual tenho andado a trabalhar! A receção pelo Hugo foi no mínimo fantástica, os meus pais na meta à minha espera foram só o tónico final para este final bastante mais emotivo do que tinha planeado... Assim que cortei a meta, dei um "mais cinco" ao Hugo e dirigi-me imediatamente ao meu pai para lhe dar um abraço de enorme cumplicidade pelo caminho que temos trilhado em conjunto neste Mundo do Trail! Um beijo de agradecimento à mãe por estar sempre lá e fui finalmente dar os parabéns ao Bruno e ao João Lopes (vencedores dos 50kms e dos 25kms) pelas enormes provas que fizeram... O Bruno não o via desde o abastecimento dos 15kms e o João desde que passou por mim a grande velocidade na subida do moinho! Estão os dois umas grandes máquinas, é um prazer partilhar os trilhos convosco, muitos parabéns!  

Os quatro que falei antes, eu, o Bruno, o Hugo e o João

A nível pessoal já disse o quão boa foi esta prova! Foi o último teste a sério para o tal "momento" que falo no título, o Ultra Trail do Zêzere... Não tenho maneira de saber como vai correr a prova mas de uma coisa tenho a certeza: preparei-me da melhor maneira que podia e agora só quero desfrutar do trabalho que fiz! 

Abraço ao meu pai no final da prova

A nível da organização, não tenho palavras para vós! Em cada abastecimento tinha tudo aquilo que precisei, as marcações estavam perfeitas (só quando me distraí é que saí do percurso), o ambiente da meta estava muito bom (o Hugo é ótimo a criar esse ambiente), a refeição final e os banhos quentes foram só a cereja no topo do bolo de uma organização que demonstrou muito bem como organizar uma prova de 100kms! Parabéns e obrigado! 

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