11ª Paragem 2023/2024: Campeonato Nacional Ultra Trail

Campeonato Nacional de Ultra Trail - Santo Thyrso de Ultra Trail

Tempo: 04:44:56
Distância: 48km
Desnível Positivo: 2436m
Classificação Geral: 25º Classificado

Apesar de, numa fase inicial, o Campeonato Nacional de Ultra Trail não estar previsto nos planos, a evolução que tive desde o início da época deixou a curiosidade de perceber o que faria no meio dos melhores do país. Não conhecia, de todo, a realidade do trail nacional (a realidade que vem logo a seguir aos melhores) e isso deixava-me na expectativa de me tentar enquadrar. Além disso, a conclusão desta prova deixaria sempre um termo de comparação com os melhores atletas, permitindo certas avaliações de performance num futuro próximo. Não me entendam mal, eu adoro trail, eu adoro o conceito de superação com que somos constantemente confrontados ao longo das provas na montanha, adoro a simples possibilidade de poder chegar a um sítio e explorar, tal como fazemos quando andamos a “vaguear” pelos trilhos. Mas, por favor, não me tirem a competição! Adoro evoluir, adoro sentir-me capaz onde não me sentia antes, adoro conseguir chegar um bocadinho mais à frente do que fiz uns meses atrás. É para isso que treino e é para isso que continuarei a treinar! 

Após esta introdução, a verdade é que cheguei à prova de Santo Tirso com uma capacidade que não pensei atingir tão rápido (era preciso correr tudo perto da perfeição, o corpo recuperar rotinas que tinha perdido há algum tempo, e tudo isso se verificou) e encarei a prova como o momento para dar o meu máximo. Cheguei na véspera, preparei tudo com o máximo rigor, levei todo o material que tinha em casa para garantir que não me faltava nada e fui descansar. No dia seguinte, ao toque do despertador, saí tranquilamente da cama e comecei a preparar-me. Sabia que jogava ali um momento de reconciliação com o trail. Estava no meio dos melhores, estava preparado, queria competir. Tomei o meu pequeno almoço, comecei a vestir e seguimos para o local que eu pensei ser o da partida. Eu juro que costumo ler os regulamentos mas, desta vez, o foco estava tanto em não falhar nenhum material e ter a prova bem planeada, que esqueci tudo o resto. O meu pai percebeu que o local de partida não seria o pavilhão, lá descobrimos que era na zona da Câmara Municipal e, à medida que nos aproximávamos da zona da partida, ouvíamos a inconfundível voz do Joca a dar indicações sobre a prova… Não havia dúvidas, era mesmo ali. Últimos preparativos, despedi-me da Inês e dos meus pais e segui para um rápido controlo zero (estava tudo bem compartimentado para não perder tempo a mostrar) e fui para o meio dos melhores atletas nacionais. O nervosismo era evidente, saiam alguns laivos de bocas saudáveis, mas a verdade é que nem isso estava a surtir grande efeito. Toda a gente queria sair para correr. Indicações dadas, atletas prontos e o Campeonato Nacional de Ultra Trail estava “na estrada”. 

Momentos de "tensão" pré prova (Fonte: Matias Novo)

Um primeiro quilómetro citadino, ritmo controlado na frente e um grande pelotão a formar-se atrás dos favoritos. A inclinação ainda não era muita, aparentemente na frente também não havia vontade de partir imediatamente a corda e seguimos cerca de 2km, até ao primeiro single track mais comprido, todos em grupo. No primeiro trilho a subir, forma-se uma fila de atletas e, à saída, estava lançada a prova. Lançada e de que maneira. A partir daquele momento, parecia que ninguém queria perder um segundo que fosse! Com os primeiros 8km a serem quase todos a subir, tentei arranjar um grupo forte onde me enquadrasse e pudesse ir certinho, mas entrei num comboio com um ritmo claramente superior ao meu e optei por me resguardar. Acabo por fazer uma subida sempre a perder lugares mas a saber que o ritmo não estava assim tão fraco. Restava-me acreditar na minha capacidade de compreender a prova e esperar que, mais para a frente, pudesse recuperar. Passo no primeiro abastecimento na 28a posição, mas passo na frente de um grupo que acaba por me passar no topo da subida e, aquele sim, era o comboio que eu tinha que apanhar. O ritmo ia certinho, não estavam a quebrar e não me podia deixar ficar mais para trás. Arrisquei um pouco a seguir com o grupo mas a verdade é que me estava a sentir bem! Já tínhamos passado uma fase com bastante desnível, as pernas continuavam ótimas e sabia que, depois das duas ultras no mês anterior, podia arriscar um pouco mais. 

Passagem após os 8km (Fonte: Eduardo Campos)

Dos 8 aos 18km o filme da prova foi mais ou menos o mesmo. Andei naquele grupo, subia forte, mas o rolar não estava fácil de acompanhar. Em certos momentos perdi o contacto do grupo, mas estava ciente que a diferença não era grande. Passo aos 18km na 30a posição, com a tal passagem do comboio rápido por mim, mas a minha prova estava prestes a mudar. Dos 18 até ao segundo abastecimento a prova decorria, essencialmente, em terreno a subir. O José Alves, do Espite, vinha de trás e estava a subir muito bem. Acabei por me juntar a ele e, nessa fase pré abastecimento, metemos um ritmo bastante forte! Na subida final vejo a magia de um Campeonato Nacional! Um mar de gente esperava pelos atletas no topo da subida, muitos gritos, muita “emoção” no ar (no primeiro abastecimento já havia bastante gente, mas nada como no segundo). É daquelas sensações que, só passando lá, como atleta, é que se percebe a dimensão. O cansaço desaparece e fica no seu lugar uma vontade enorme de focar para não desatar a correr ali como se fosse o sprint final. Cheguei, enchi flasks e segui viagem. O José Alves despachou-se primeiro que eu, então forcei um bocadinho a passada para conseguir recolar nele. 

Momentos após o segundo abastecimento, quando estiquei o andamento (Fonte: Bruno Batista)

E, com toda a emoção do abastecimento (que acreditem que fica na cabeça), com o aumentar da passada deste último quilómetro, o corpo começou a pedir mais! O corpo pede mais, as sensações são boas, a cabeça começa a perguntar: “E se corre bem?”. Só há uma maneira de saber, vamos arriscar. Dos 20km para a frente o foco passou a ser, essencialmente, competitivo. Ou melhor, o foco sempre foi esse mas, a partir daquele momento, tentei ser o mais económico possível, arranjar as melhores "boleias" possíveis e ir vendo como corria a vida na classificação geral. As sensações estavam ótimas, queria chegar sempre um lugar mais à frente. Entrou a prova pequena no nosso percurso e foram mais uns para ajudar a motivar a chegar a quem estava imediatamente à frente. As sensações eram tão boas que, na fase mais técnica da prova (e também a mais bonita), consegui, segundo os registos da classificação aproximar-me de quem ia à minha frente (depois tenho que vos falar das sapatilhas que usei na prova), passei de 4' de atraso para 3', em relação ao 16º. Passei a zona da cascata com uma vontade enorme de galgar posições a cada pedra que ultrapassava. Só queria que aquela sensação fosse até ao fim! A zona do rio marcava a barreira em que as boas sensações dos Trilhos dos Reis tinham acabado, os 30km. Mas ali as contas estavam a ser diferentes. A melhor preparação, a maior experiência, estavam a deixar levar o esforço mais além. E a melhor parte é que, segundo o que tinha visto no gráfico, os 30km culminavam também a zona de maior desnível da prova. Tudo se estava a encaminhar. Já estava na beira do top 20 e, quem seguia à minha frente, não estava assim tão longe. Mas como a regra mãe das ultras tem sempre que se aplicar, como me estava a sentir muito bem, essa sensação acabou por passar. Aos 39km, pouco antes da descida para o abastecimento, as forças começaram a diminuir. Aquele avançar vigoroso estava a ser tomado por uma vontade de poupar sempre que desse, de não forçar os músculos mais do que o necessário. A questão é que, mesmo que as previsões mais animadoras da prova estivessem corretas, ainda faltavam 6km (mal eu sabia que ainda faltavam 9). A partir daqui, as regras passaram a ser: tentar correr a subir, mas sem forçar demasiado, passo curto; a direito tentar correr forte; descer técnico com atenções redobradas. Na primeira descida, passaram logo dois atletas, na subida seguinte (que eu pensava ser das últimas), após o abastecimento, consegui manter um bom ritmo e não perdi lugares nem senti aproximações. O problema foi quando eu percebi que, apesar da maior parte do desnível estar até aos 30km, as subidas finais não eram menos duras. Fiz as últimas duas em sofrimento, a tentar não perder demasiado e, agora que já passou, digo que até tive bastante sucesso, podia ter sido muito pior! Perdi mais um lugar no final da última subida dura, antes de chegar à Capela, ao ponto de chegar à praça com 200m planos, após a subida, e fazer uns passos a andar, para conseguir recuperar o fôlego. 

Descida final, após a passagem na praça da Capela (Fonte: Fernando Ramos)

A 3km da meta perdi um lugar pela última vez. Sabia que tinha que tentar agarrar-me àquele lugar, mas foi um luta inglória e acabei mesmo por ficar sozinho. De qualquer maneira, ainda tentei fazer um final forte e, mais uma vez, acho que consegui. Dei tudo de mim. Acabei com um 25o lugar que, com a preparação que tinha, me deixou bastante satisfeito! Aqueles 19km deixaram água na boca e, após todas as análises, chegámos a uma conclusão… Se queres que essa sensação dure mais, treina mais! E é isso que vamos fazer! 
Metros finais do Campeonato Nacional de Ultra Trail (Fonte: Vídeo da Inês)

Terminei a prova completamente exausto, sem conseguir comer rigorosamente nada. Entrou coca-cola, mas nem um flask inteiro consegui beber. Valeu o banho de água quente para voltar a dar alguma tranquilidade ao corpo e à mente. Estava feito o Campeonato Nacional de Ultra Trail, estava na hora de descansar. 

Relativamente à prova em si! Brutal! Um percurso magnífico, dureza com fartura, aquela zona da cascata a dar uma magia enorme à prova. Fiquei fã! O apoio foi fenomenal e, não me canso de o dizer, obrigado a todos os que puxam por mim! Ouvir o meu nome ou ouvir falar no “caracol” dá uma força difícil de descrever! Boas sinalizações e abastecimentos com tudo o que precisei e pessoal dinâmico a querer ajudar os atletas! Muitos parabéns! 

Comentários

  1. Há algum tempo acompanho seu blog e suas novas postagens nunca deixam de me impressionar.

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