Um regresso especial: Trail do Almonda 2023

 “É verdade. Surgiu esta oportunidade, pedi autorização ao U. Tomar, eles autorizaram e eu agradeço por isso. Foi um dia especial, fiz a prova num sítio onde passei centenas de horas a treinar, passei por pessoas que me acompanharam durante horas infinitas e vesti esta camisola “onde tudo começou”. Foi bom voltar a ter estas sensações.” - Conversa no final da prova com o Hugo Água (uma conversa, porque a única característica de entrevista que teve aquele momento foi o microfone)

Conversa com o Hugo Água no final do Trail do Almonda, a lembrar os bons velhos tempos


(3h antes)


Já não competia há algum tempo e ainda andava à procura das melhores sensações. Surgiu a oportunidade de fazer o Trail do Almonda, a prova do Caracol Trail Team (para os mais recentes, a equipa que representei durante muitos anos, quando dei os primeiros passos no trail), de novo com a camisola do Caracol, com o objetivo de fazer um treino “longo”. Não sabia bem se seria longo, mas sabia que de treino teria pouco… Tinha saudades do meu trail, do verdadeiro trail; Tinha saudades das subidas de 2,5km com quase 500 D+, tinha saudades das descidas vertiginosas, tinha saudades de meter ritmos entre as subidas e descidas mais duras. Cheguei ao local da partida, tinha lá todas as caras conhecidas da equipa, era momento de meter a conversa em dia, preparar para a prova e seguir para a partida. Antes de arrancar ainda fiz um aquecimento até à entrada da Serra, onde estava o meu pai… Dei-lhe dois beijos, perguntei se estava tudo pronto e regressei ao local da partida. Troquei umas palavras com o padrinho da prova, o Luís Cancela, um beijo à Inês, um adeus à mana que ficava no abastecimento à espera dos atletas e, no final da contagem de 10 a 0 pelo Hugo Água, seguimos para os 16km do Trail do Almonda. 


Metros iniciais da prova


Os metros iniciais da prova de 16km são, provavelmente, os únicos metros planos de todo o percurso. A prova arranca, conheço de olhos fechado o caminho até à entrada na serra e lanço-me para a frente da prova. Os 1000 metros iniciais são feitos confortavelmente, a um ritmo intenso, mas não demasiado. Passo pelo meu pai na zona em que iniciamos a zona de trilhos, ele sorri e diz “está-te o corpinho a pedir chuva”. Eu sorri de volta e disse aquilo que motivou ao título deste post: “Quando rebentar, rebentou”. Tinha demasiadas saudades daquela serra, queria aproveitar cada metro de desnível, cada pedrinha que tivesse que pisar (e eu sabia bem que seriam muitas). Fiz a subida inicial, continuei em primeiro, virámos no estradão e logo voltámos a entrar em trilho (é incrível como numa serra daquelas, se percorreram tão poucos metros em estradão). Aproveito que conheço o terreno e meto-me na frente do outro rapaz que seguia comigo na frente. O desnível ainda não era muito, mas já se sentia que a minha praia não era, de todo aquela. Passamos os escuteiros, atravessamos rapidamente o estradão e entramos no Trilho da Antonieta… O caminho até ao Fojo, com trilho do Downhill e com os Medronheiros, já era difícil, mas esta malta conseguiu arranjar uma subida que não tem um único metro a descer 😱


Passagem pelo Campo Escola, antes de entrar no Trilho da Antonieta


Continuo na frente, mas cada vez sinto mais que está a chegar ao fim a epopeia. Pergunto ao outro rapaz se quer passar, ele diz que não precisa, então continuo na frente. Tento acalmar o ritmo porque sei bem o que aí vem… O que se seguia na prova era apenas, o último Vale que consegui dominar nos meus treinos da Serra D’Aire. A inclinação é estupenda e as pedras não facilitam nada a progressão. Assim que entro no trilho do Vale Fojo, os 450D+ em 2,5km, encosto para o lado. O meu tempo de liderança na prova estava feito e não havia necessidade de ir a atrasar os outros. Assim que encosto, passa o rapaz que fez o início todo comigo e o duo que nos perseguia e entretanto já tinha colado. A partir daqui a gestão da subida era fácil: Correr quando desse, andar quando não desse e ir bebendo água sempre que possível. E assim foi… Até chegar às antenas perdi só mais um lugar e, paulatinamente, fui percorrendo e relembrando (incrível como ainda me lembro dos troços que utilizava a treinar) todas as vezes que por ali passei quando andava a treinar para o MIUT. Chegando ao topo da serra, acabou-se o andar… Havia que tentar andar o mais rápido possível para recuperar do atraso para os 4 que seguiam à minha frente. Saio do abastecimento (enchi só o flask) e começo a descida… Enquanto fui em estradão, consegui imprimir ritmos fortes e ouvia atrás de mim os outros dois atletas que se tinham aproximado na subida. O grande problema foi quando voltámos à pedra, nos trilhos após a lagoa… A escolha de onde metia cada passada era criteriosa e, por muito que me tentasse abstrair disso, acabava sempre por perder muito mais tempo que os restantes companheiros de prova. Mas como isto só com treino na Serra é que lá vai, estava na hora de dar o meu melhor e, no fim, fariam-se as contas. O saldo da travessia Antenas/Vale Garcia traduzia-se em dois lugares para trás. Foi bom ver o pessoal a passar, ver o ritmo que estavam a levar por entre as pedras e perceber que, um dia, também já corri assim 😅


Na minha cabeça estava que o pior estava quase no fim… O topo da serra é a zona mais rochosa e seria ali que iria perder mais tempo. Era um ótimo pensamento, pena que as minhas memórias me tivessem atraiçoado de sobremaneira. Quando entrei no Vale Garcia, lembrei-me que as rochas eram muito menos, mas o desnível e a curva e contra curva obrigavam a uma “ginga” que já há muito perdi. 2km de trilho foram o equivalente a mais dois lugares perdidos e, acima de tudo, o equivalente a uma consciencialização que, se queres andar com os melhores, tens que treinar como eles. Tentei perder o mínimo possível na zona com maior desnível, mas cheguei a uma altura em que o foco já era mesmo só o de chegar ao estradão. As coxas começaram a picar, as pernas começaram a ficar muito piores que com a subida e comecei, finalmente, a olhar para o relógio. Os últimos metros do vale já são feitos num trilho mais fácil e é ali que início a minha recuperação… Os lugares da frente já eram impossíveis, mas pelo menos as ultrapassagens desta última descida não podiam estar muito longe. Felizmente, desta vez tive razão, tinha os dois em linha de vista. Passei pelo meu mano, sorri, “meti a mudança abaixo” e arranquei… 


No final do Vale Alto 

Os quilómetros ao lado do rio pela Capital, a ritmos fortes, tinham que valer de alguma coisa naquela prova. Aproximei-me do 8º lugar e, logo na descida para a estação elevatória, aproximei-me do 7º lugar. Fazemos o trilho à esquerda da estação e sigo naquele grupo de 3, mas com boas sensações. Sabia que o final era mais propício para mim e, assim que pude, arranquei sozinho. A tecnicidade já era bem mais baixa, o desnível também, então acabei por conseguir manter o ritmo com que sai do grupo. Passei pelo meu pai, desabafo o quão lento me senti ao longo das descidas e sigo para o Pedrogão. Uns metros curtos em estradão, um último trilho técnico e ouve-se o Hugo Água, com a sua boa disposição, a anunciar o pessoal da frente a chegar. Meto o ritmo mais forte que consigo, tento aproveita a boleia que a Inês me deu no último quilómetro, mas a força que tinha na altura já não permitia, de todo, o ritmo forte que queria estar a pôr e, ao fim de 1h26’ (tinha-me proposto a algo entre a 1h15’ e 1h30’), lá cheguei ao abastecimento final. Cumprimentar todos os atletas que chegaram, uma pequena conversa com o Hugo, que também me ajudou a recordar as imensas horas que passei a treinar naquela serra e ir buscar a Família Casanova Silva Cruz, que se lançaram a este desafio com garra e determinação. 


Metros finais com a Inês ao lado e eu já sem conseguir puxar mais nada 


Resumindo: Foi bom voltar, foi bom voltar a sentir a festa do trail. Vou voltar… Não sei quando, mas vou :)

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